A
Saúde como Elemento para Repensar a Prática do Ensino
Por Juliana de Souza
Ensinar
já foi visto como um dom, uma função de alto valor social , valorizada pelos
cidadãos e assumida pela sociedade como
uma atividade pública. Atualmente essa atividade perdeu esse sentido
totalmente.
Devido
ao aumento do capitalismo, novas modificações foram promovidas e a educação passou a ser vista
como mercadoria , visando sempre obter
lucro. Um exemplo disso é a prática de ensino. A educação tornou-se um
dos setores mais lucrativos sendo um investimento que gera um retorno imediato
desencadeado pelo desmoronamento da
educação gratuita e pública. Assim, é possível
aplicar à essa atividade a lógica de produção capitalista ,
possivelmente gerenciando aqueles que produzem tal “mercadoria” (os
professores) , como se gerencia os trabalhadores de uma fábrica. Assim , várias
regras como as aplicadas aos demais trabalhadores dos setores primário e
secundário da economia foram aplicadas aos professores: controle de produtividade, do
ritmo de trabalho, do tipo de tarefa a executar, tempo para sua execução, da
jornada e carga de trabalho necessárias.
Inicialmente
esse processo passou pelo desmoronamento da educação pública , obrigando assim
cada vez mais os professores a ingressarem na rede privada de ensino que se
assemelha muito a uma empresa capitalista submetendo-se ao mesmo sistema de
exploração ao qual estão subjugados os trabalhadores em geral: instabilidade no
emprego, intenso ritmo de trabalho, amplas jornadas de trabalho. A partir dessa
ideia de educação vamos procurar entender a relação saúde/doença do professor.
O
trabalho humano possui um duplo caráter, por um lado é fonte de realização,
satisfação e prazer, estruturando e conformando o processo de identidade dos
sujeitos; por outro, pode também transformar-se em elemento patogênico,
tornando-se nocivo à saúde (Seligmann-Silva, 1987, Dejours, 1987).
Com o
avanço da medicina social , houve uma conscientização maior dos profissionais de saúde quanto à
necessidade de constantes serviços voltados para a prevenção e promoção da
saúde antes que ocorra a patologia. Com isso , os trabalhadores e seus
representantes estão buscando mais
medidas que garantam ambientes ocupacionais saudáveis( pode-se observar
o incremento dos estudos das relações entre condições de trabalho e saúde dos
trabalhadores).
No
entanto, a maioria das investigações está voltada para categorias de
trabalhadores onde a inter-relação entre trabalho e saúde é mais visível, pela
própria natureza da atividade, como contato com equipamentos cortantes ou
substâncias tóxicas). No Brasil, pouco tem sido feito no sentido de avaliar os
efeitos do trabalho sobre a saúde nas
categorias de trabalhadores onde os riscos são menos aparentes, como por
exemplo em professores. A maior parte da bibliografia encontrada sobre esse
assunto em questão é originária de
outros países.
Há um comum acordo nesses
estudos, de que ensinar é um ofício altamente estressante, com efeitos
evidentes na saúde física e mental, e no desempenho profissional dos
professores.
O professor é acometido de
intensa ansiedade e estresse devido à vários fatores , entre eles estão pressão
do tempo ,relacionamento com a administração e outros colegas de trabalho,
ameaças verbais e físicas feitas pelos alunos , tarefas extra-classe, reuniões
e atividades adicionais e, problemas com estudantes . Todo esse estresse tem um
grande impacto na saúde do professor, principalmente na parte psicológica,
podendo levar à depressão e falhas cognitivas.
Segundo pesquisa feita pela
Organização Internacional do Trabalho , um em cada dois professores
avaliados estava exposto ao risco de
sofrer um ataque cardíaco ; entre docentes da Hungria observou-se maior
prevalência de distúrbios causados por estresse, labirintite, faringite,
neuroses e doenças dos aparelhos locomotor e circulatório em professores; entre
educadores franceses, segundo dados oficiais, 60% dos pedidos de licença por
motivo de doença estavam relacionados a distúrbios nervosos. Além disso,
observou-se, entre pessoas hospitalizadas por doenças mentais, maior incidência
de neuroses com depressão entre os docentes do que em outras áreas
profissionais. Na Inglaterra, um estudo realizado em 1978, mostrou que 25% dos
professores não acreditavam na própria permanência na profissão pelos próximos
dez anos, e 20% a 30% deles qualificaram-na como causadora de estresse.
Nos Estados Unidos, DeFrank &
Stroup (1989) estudaram professores de escolas elementares para analisar a relação entre fatores pessoais, estresse,
insatisfação no trabalho e problemas de saúde. Dos indivíduos estudados 96%
eram mulheres, 76% casadas, com média de idade de 39, 4 (±9,2) anos e
ensinando, em média, 12,1 (±6.9) anos. De acordo com o instrumento de avaliação
de estresse usado , os itens relatados com mais frequência foram sobrecarga
laboral e problemas com os alunos (mencionados como "tentativas contínuas
de motivar estudantes que não desejam aprender").
Os problemas de saúde mais
frequentes foram: perda de energia, impaciência, dores de cabeça,
hiperalimentação, aumento da irritabilidade e dores na coluna. Em sessão aberta
do questionário, os professores qualificaram como principais fatores de
estresse: avaliações, tempo insuficiente para as tarefas determinadas ,
preocupações diárias (trabalho de casa, currículos, reuniões),
responsabilidades extracurriculares, problemas com os pais que não se
preocupavam com a vida escolar do aluno e falta de tempo para a família.
Fatores demográficos e experiência de ensino não influenciaram estresse. Estresse
apareceu como um forte preditor de insatisfação e esta mostrou-se fortemente
associada aos problemas de saúde.
No Brasil, as referências de
estudos abordando as condições de saúde e trabalho dos docentes são ainda
escassas e, apenas na segunda metade da década de 90, foram feitas algumas
investigações, abordando as condições de saúde e trabalho da escola pública. As
evidências encontradas nesses estudos são preocupantes e apontam a importância
de serem tomadas medidas imediatas. A investigação de Codo et al. (1998) sobre
a saúde mental dos professores de 1º e 2º graus em todo o país, abrangendo 1440
escolas e 30.000 professores, revelou que 26% dos professores da amostra
estudada apresentavam exaustão emocional (cerca de 1 professor a cada quatro
estudados). Essa proporção variou de 17% em Minas Gerais e Ceará a 39% no Rio
Grande do Sul. A desvalorização profissional, baixa auto-estima e ausência de
resultados percebidos no trabalho desenvolvido foram fatores importantes para o
quadro encontrado.
Ruiz et al. (1995), investigaram
a demanda de professores de 1º e 2º graus da rede pública de Sorocaba, São
Paulo, num ambulatório especializado em saúde ocupacional. A procura por
atendimento foi periódica nos semestres: no começo do ano era pequena, nos
meses seguintes aumentava, no início do 2º semestre diminuía novamente, e outra
vez aumentava no final do ano.
Durante as férias, a procura registrada era mínima. Segundo os autores, esse comportamento da demanda favorece a hipótese de que a procura do cuidado médico e, consequente afastamento do trabalho, era maior no decorrer do período letivo, revelando um desgaste crescente dos professores. Dentre as doenças mais frequentes encontraram a laringite, que representou 39,8% dos diagnósticos realizados, seguida pela asma ocupacional (15,3%), alergia ocupacional (6,8%) e lesões por esforços repetitivos (LER).
Durante as férias, a procura registrada era mínima. Segundo os autores, esse comportamento da demanda favorece a hipótese de que a procura do cuidado médico e, consequente afastamento do trabalho, era maior no decorrer do período letivo, revelando um desgaste crescente dos professores. Dentre as doenças mais frequentes encontraram a laringite, que representou 39,8% dos diagnósticos realizados, seguida pela asma ocupacional (15,3%), alergia ocupacional (6,8%) e lesões por esforços repetitivos (LER).
Carvalho (1995), analisando
professoras primárias na cidade de Belém, encontrou níveis mais elevados de
suspeita de sintomas psíquicos (de acordo com o instrumento de detecção
utilizado: o MMPI), em escolas onde se relatou um relacionamento menos
democrático com a direção, do que naquelas onde predominavam relações mais
democráticas.
Os dados examinados mostram um
conjunto de repercussões nocivas do trabalho na saúde dos docentes, ainda que
não seja tão evidente como em outras categorias profissionais.
No entanto, a grande maioria dos
estudos investigou escolas públicas. Considerando que o ensino em escolas
particulares, em muitos aspectos se distingue, radicalmente, das escolas
públicas, Se torna importante a avaliação da saúde dos professores, no contexto
específico das escolas particulares. Essa necessidade é mais ampla quando o
crescimento acelerado do número dessas escolas é considerado, observado no
Brasil nos últimos anos.
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